quinta-feira, 5 de março de 2009

Invadem-me a natureza da madeira, o odor das tintas...


Desconcertam-me as paredes, as portas, as janelas fechadas. 
Sombras 
de uma dor conquistada, que se revelam
sem que o sol desapareça. 


Divisão vertical sobre a terra, poeira 
lameliforme que se lança 
compacta sobre os olhos naturais e belos. Selvagens e burlescas 
são as portas, as paredes, as janelas fechadas. dominós alexandrinos 
tudo escondem
e o que há de mais sublimemente interior não é provado, fica o desejo 
do beijo e a boca 
que morde o nada. 


Em si mesmas, no verão, as paredes são zimbro que arrefece e gela
as rosáceas que emergem dos vitrais; no coração, toda a ternura emancipada, 
urgente
recolhe ao seu alvéolo. 


Ao íntimo dos ossos 
chegam as portas inamovíveis, duram 
na velocidade dos pés que pretendem descalços entrar 
na ternura da terra pronta.


Eu sou um mal menor. As paredes, as portas, as janelas fechadas 
são uma alucinação tricórnia e compacta. Crescem 
entre a giesta e o amor. Despedaçam a cal, sua pureza.


Invadem-me, a natureza da madeira, o odor das tintas, a propriedade 
das barras, a constituição do cimento, o domínio das pedras 
sobre pedras. Doem-me 
a obstinação dos batentes, o temperamento 
das dobradiças, a personalidade das fechaduras, a essência 
dos frisos de argamassa, a taipa. 


Arde-me a pompa dos umbrais. 


As paredes, as portas, as janelas fechadas avançam, rectilíneas, deslizam 
na confusão ingénua dos cabelos, na curva atordoada do pescoço, erguem-se 
na súbita contrição da pele, devoram-me 
o coração e os olhos. 
Não vejo o sol. não vejo o sol. não vejo o sol. 
Não sinto a chuva. tão cedo 
não torno às árvores nem aos frutos nem às aves nem 
à desassossegada intenção do amor.


As paredes, as portas, as janelas fechadas, são uma convenção ignóbil, uma indecência. Que um cão sem nome leve consigo a casa aberta, devore o saibro, a taipa, a cal, o vento que não devolve as coisas
ao seu lugar antigo.


Se os olhos podem ver a sua cor
na pupila luminosa
além do olhar humano, não fique esta vontade desassombrada crescendo, crescendo sobre as densas paredes, sobre as portas, sobre as janelas fechadas. Incerteza 

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